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Os Siris Azuis (Callinectes): como eles se distribuem no ambiente?
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Os siris ou caranguejos nadadores pertencem a família Portunidae e estão alocados em um grupo de crustáceos chamado de Brachyura. Os braquiúros compreendem todos os caranguejos "verdadeiros" que apresentam cinco pares de patas, sendo os dois primeiros modificados para a manipulação do alimento (os quelípodos). Existem nove gêneros de siris no litoral brasileiro: Arenaeus, Callinectes (os siris azuis), Coenophthalmus, Cronius, Laleonectes, Ovalipes, Portunus, Scylla e o gênero exótico Charybdis, compreendendo 21 espécies. Os Callinectes são representados por seis espécies: C. bocourti A. Milne-Edwards, 1879; C. danae Smith, 1869; C. exasperatus (Gerstaecker, 1856); C. larvatus Ordway, 1863; C. ornatus Ordway, 1863 e C. sapidus Rathbun, 1895 e possuem ampla distribuição, podendo ser encontrados em lagunas, manguezais, estuários e na plataforma, em profundidades de até 90 metros. ). Mais duas espécies, C. maracaiboensis Taissoun, 1972 e C. affinis Fausto-Filho, 1980 são citadas para a costa brasileira. Entretanto a primeira foi considerada como sinônimo júnior de C. bocourti e a segunda não é considerada no livro de Melo publicado em 1996. O gênero tem sido objeto de diversos estudos no litoral brasileiro. Os trabalhos realizados na plataforma continental têm demonstrado que C. danae e C. ornatus são as espécies mais abundantes nessas áreas.
Entretanto, trabalhos realizados em áreas estuarinas, onde grupo é dominante entre os braquiúros, observam uma segregação na distribuição dos Callinectes, com a espécie mais abundante mudando ao longo do estuário. Alguns trabalhos têm demonstrado que diversos fatores podem influenciar a distribuição das espécies de Callinectes em um estuário, sendo a salinidade o principal condicionante. Norse, em seu trabalho publicado em 1978, verificou que a distribuição dos portunídeos nas áreas estuarinas reflete variações na tolerância à baixa salinidade entre as espécies, uma vez que todas demonstraram-se tolerantes às salinidades mais elevadas. Carvalho em um trabalho realizado no litoral sul da Bahia em 2009 verificou dois gradientes principais na distribuição dos Callinectes no estuário do Rio Cachoeira: o primeiro influenciado pelas áreas de maior e menor influência marinha e outro representando um gradiente transversal do estuário, com algumas espécies ocorrendo exclusivamente ou predominantemente nas margens e outras ocorrendo com maior abundância nas calhas ou em ambas as áreas. Em relação ao primeiro gradiente, Callinectes ornatus apresentou uma nítida preferência pela área mais externa do estuário, Callinectes larvatus foi predominante na região externa e intermediária e Callinectes danae e Callinectes exasperatus foram registrados ao longo de toda a área estuarina estudada.
Além dessa diferença na distribuição das espécies ao longo do estuário, as espécies também apresentam distribuições distintas em relação ao perfil transversal do mesmo (o segundo gradiente citado). Esse comportamento pode ser observado por meio da diferença na captura das espécies entre a calha e a margem estuarina. Callinectesdanae foi a única espécie encontrada tanto na calha quanto na margem de todas as áreas estudadas. Apesar de C. exasperatus ter também ocorrido em todas as estações, ficou restrita às margens, principalmente nas áreas mais internas próximas aos Manguezais, onde o sedimento apresentava os maiores teores de matéria orgânica. Por esse motivo a espécie também é conhecida popularmente como siri-de-mangue. Comportamento semelhante foi observado para a espécie C. larvatus, que ocorreu predominantemente nas margens das áreas externas e intermediárias. Embora C. ornatus tenha ocorrido tanto na calha quanto na margem nas área mais externa, nas regiões intermediárias esta espécie foi registrada apenas na calha, onde são registrados os maiores valores de salinidade propiciada pela presença da cunha salina. Também abordando a distribuição dos siris azuis nesse tipo de ecossistema, Buchanan & Stoner, em 1988, sugeriram que o padrão de distribuição das espécies de Callinectes pode ser resultado de complexas interações intra- e interespecíficas entre as espécies congêneres.
Além das diferenças entre as espécies quanto a sua distribuição espacial, os indivíduos de cada espécie podem apresentar distribuições distintas em função do seu estágio de desenvolvimento. Alguns trabalhos demonstraram que as fêmeas de Callinectes migram para áreas mais externas do estuário durante a desova. Esse comportamento pode causar diferenças na proporção sexual em determinados períodos do ano. Tal disparidade na proporção sexual esperada de 1:1 é comum nos crustáceos e pode estar relacionada não só à migração, como também a outros aspectos da estratégia reprodutiva da espécie, como o padrão de dispersão, mortalidade e taxas de crescimento diferenciadas entre os sexos. Além disso, as classes etárias também apresentam distribuições diferentes ao longo da área estuarina, com os indivíduos juvenis apresentaram sendo registrados principalmente em áreas mais internas do estuário e próximas à margem.
Referências
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